Resposta à meu próprio desabafo

by 15:24:00 10 comentários
Ontem foi publicado um texto meu no blog da Lola. E o que li nos comentários me fez perceber mais uma vez que lemos tão pouco que pecamos na interpretação. Não estou me pondo como um exemplo em língua portuguesa, muito pelo contrário, me bato até hoje no lance dos porquês. Nunca consegui memorizar aquela regrinha chata de como usá-los. 
 Mas o que li foi MUITA coisa com interpretação oposta ao intuito do texto em si. Vi minhas palavras distorcidas e remendadas. Não vou dizer que sofri, que chorei... Na verdade, achei até engraçadas as coisas que li, mas resolvi explicar o ponto tão abordado no meu texto. E lá vamos nós!
"Só um negro pode escrever sobre o que é ser negro, sobre a vida negra... Então parem vocês brancos de agir como se soubessem o que é ser negro. 
 Juro pra vocês que não achei que essa frase que é logo explicada na frase seguinte fosse gerar 80% dos comentários publicados. Gente, é ÓBVIO que qualquer pessoa pode escrever sobre o que quiser, o que meu desabafo fala é sobre a propriedade que as pessoas tomam sobre aquilo que não lhes cabe, que não lhes é vivido. 
 Eu sou negra, certo. Sei falar daquilo que EU vivo. Posso lhe dizer com propriedade de como é ser negro, de como me sinto quando sofro discriminação. Mas eu não sei como um índio se sente perante mesma situação ou similar. Não sei como um japonês se sente, como um branco se sente.  Sou bissexual, e sei como foi horrível ficar ouvindo que eu era indecisa, que "isso" era porque eu queria chamar atenção, que eu dizia ser por estar na moda. Eu posso falar sobre o que senti sobre isso, mas não posso falar com propriedade sobre como uma travesti se sente, posso imaginar, mas não dizer com propriedade sobre isso. 
 Revoltei-me contra esse domínio branco na escrita a respeito de negros porque é o que mais tem sido feito ao longo dos anos e nada mais justo que meu povo tenha voz. Que meu povo possa falar de si, da forma como se vê e do modo como se sente perante a cada coisa dita por alguém que não sabe da missa o terço, sobre nossa realidade. Mas eu não desejo isso só para negros. Claro que não! Eu quero ver mulheres brancas ou negras, homens cis ou não, índios, homossexuais, anões, ET's e seja lá mais quem for escrevendo sobre como vê sua própria realidade. Isso não é apartheid, é deixar ainda mais claro a realidade de cada um, visto por esse cada um.
 Tendo em vista todos esses argumentos apresentados por mim, acredito que fique esclarecido que eu não sou extremista, nem racista. Até a próxima, pessoal.

Yoshi

Developer

Curiosa, viciada em séries, designer, feminista graças à Deusa e pisciana, graças ao universo.

10 comentários:

  1. Excelente Yoshi. Vc poderia postar lá como comentário, ou a Lola como update. :)

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    1. Acho que vou por como comentário... É mais correto que mais uma postagem com meu nome lá! kkk

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    2. Eu vi,*-* obrigada.

      Mas puts.. Incrível como sempre tem um tapado que não entende nada. Como pode?

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    3. Vai continuar a ter gente me apedrejando, pode apostar. kkkk

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  2. Outro ótimo texto! O problema é que quem nunca foi diminuído não acha admissível ser "colocado" ao lado de uma luta e não nela. É como um homem que se acha injustiçado quando uma mulher diz que ele não pode ser um feminista ou quando, como nesse caso, um branco se sente ofendido quando uma outra pessoa diz que ele não pode falar como é ser um negro. Estão tão acostumados com protagonismos que não querem deixar de ter mais um.

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    1. Bem verdade, Mari. E isso é tão irritante! Cansada desse pessoal já.

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  3. Se me permite um comentário, eu acho interessante o ponto de vista de que uma realidade pode ser melhor contada por quem a viveu, e lamento principalmente que no Brasil os negros não tenham voz ativa na narrativa das suas histórias. Mas penso que um autor, um escritor, e mesmo um jornalista, não estão incapacitados de contar uma história, de inventar uma história sobre alguém que não tenha nada a ver com ele. Pra isso, os autores estudam, aprendem, conversam com pessoas semelhantes ao seus personagens. Só quis pontuar essa observação para que não passemos a achar que só um pescador pode falar sobre a vida no mar, só um padre pode falar sobre a vida no monastério e etc.

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  4. Bom, como eu já disse e repeti, não falei nunca que não podem escrever sobre outros. O que está havendo DE NOVO é a falta de interpretação de texto.

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  5. Nem eu falei isso. Pelo jeito, da mesma forma que vc acusa as pessoas de não saberem interpretar texto, vc tbm não está sabendo. Eu quis dizer que escritores podem falar sobre um assunto mesmo que seja algo que, segundo vc, "não lhes cabe, que não lhes é vivido". De outra forma, um biógrafo, um historiador jamais poderia escrever sobre pessoas que não conheceu ou épocas que não viveu. Mas ele estuda, entrevista, pesquisa pra isso. Mas parece que vc decidiu que quem viveu algo é dono daquilo. Tipo Caetano e amigos querendo proibir biografias.

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    1. Não. Caetano proibir biografias, na minha opinião é ir de encontro ao que ele lutou contra no passado. E eu disse que todos podem escrever a respeito do que quiser, desde que não tomem propriedade daquilo como se soubesse exatamente o que é. E já cansei de explicar isso também.

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